Não é de graça que a Medida Provisória (MP) 449, assinada pelo governo federal em dezembro do ano passado, já tem quase 400 emendas durante a tramitação no Congresso Nacional, onde poderá se transformar em lei.
Isso é prova das várias contestações que estão sendo feitas aos artigos da medida. Diretores da Associação Empresarial da Região Metropolitana de Florianópolis (AEMFLO) e da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de São José analisaram a MP e concordam que o texto pode trazer grandes prejuízos ao setor empresarial.
Um dos exemplos mais absurdos na opinião do diretor de Relações Políticas da AEMFLO, José Carlos da Silva, é a tentativa de arrolar os bens do cônjuge, inclusive os não-comunicáveis. Na prática, vamos supor que uma esposa tenha um patrimônio oriundo de herança, portanto, não-comunicável com o cônjuge. Caso o marido tenha um débito tributário acima de R$ 500 mil, os bens não-comunicáveis da esposa podem ser arrolados.
“É uma restrição incabível. Se a esposa quiser vender algum bem, que pertence a ela numa fase anterior ao casamento, e que ao cônjuge dela não cabe direito algum, terá de informar para a Receita Federal? Não poderá dispor deste bem livremente por uma dívida contraída pelo cônjuge? A inclusão destes incisos está eivada de ilegalidade. Portanto, deve ser questionada judicialmente”, aconselha Silva.
Em linhas gerais, a MP implementou diversas alterações nas regras do parcelamento ordinário de débitos tributários, concedeu a remissão (perdão) para débitos de baixo valor, instituiu o chamado regime tributário de transição e trouxe algumas alterações na legislação tributária, entre elas, alterou algumas regras de compensação de tributos federais.
Entre os exemplos pode-se citar as ações de pagamento ou parcelamento de saldo remanescente de débitos, para o Programa de Recuperação Fiscal (Refis) e para o Parcelamento Especial (Paes). Na prática, após recompor os saldos originalmente confessados, será aplicada a taxa Selic para atualizar o débito. Depois dessa atualização e descontado o que já foi pago é que poderá ser refeito o parcelamento ou pagamento à vista. Se pago à vista ou parcelado em até seis meses, haverá redução de 100% das multas de mora e de ofício, de 30% dos juros de mora e de 100% sobre o valor do encargo legal. Outra opção é pagar em até 24 vezes. Nesse caso, terá redução de 80% das multas de mora e de ofício, de 30% dos juros de mora e de 100% sobre o valor do encargo legal. Também há opção de parcelamento em até 120 meses. Os parcelamentos do Refis e do Paes são atualizados pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que em 2008 fechou em 6,25%, enquanto que a Selic está em 12,75% ao ano.
“É preciso que as empresas optantes pelo Refis e Paes vejam com calma se vale a pena, financeiramente falando, optar por esse novo parcelamento concedido pela MP 449 e deixar de lado os benefícios das outras modalidades”, adverte João Carlos da Silva, presidente da Orsitec Assessoria Contábil e Empresarial.
Na opinião do diretor Jurídico da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de São José e titular do Escritório Hadlich & Advogados Associados S/S, Renato Hadlich, o mais grave na MP é a restrição em razão da introdução do inciso IV no parágrafo 3º do art. 74 da Lei 9430/96, que impediu a quitação pela compensação dos valores do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) devidos por empresas no Lucro Real (lucro tributável) calculados pelo regime de estimativa mensal. “Das alterações introduzidas, essa terá amplo reflexo prejudicial para as empresas, pois utilizavam seus créditos, como o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), para pagamento do IRPJ e da CSLL devidos mensalmente pelo regime de estimativa. Dessa forma, o governo federal prejudica as empresas e força o desembolso desnecessário de valores para quitação de impostos, sem permitir a utilização de créditos, que vão demorar para serem restituídos”, comenta Hadlich.
Para o advogado, o pior será para as empresas enquadradas no Lucro Real e no regime não-cumulativo do PIS/COFINS, no qual as empresas já se utilizam dos créditos decorrentes das aquisições de insumos para o pagamento dos dois tributos. Consequentemente, se estas empresas também forem credoras de PIS/COFINS, estes créditos e outros que existirem (como o do IPI) não poderão ser utilizados pela empresa rapidamente, sendo necessário que optem somente pelo ressarcimento das quantias pelo governo federal, que terá o prazo de cinco anos para fazê-lo.
A MP poderá provocar grandes mudanças nos padrões contábeis, que resultará em efeitos fiscais, uma vez que a contabilidade é a base da tributação. As práticas contábeis no país, a partir da Lei 11.638, de dezembro de 2007, alteraram e adicionaram dispositivos à chamada Lei das S/A e prevê que as práticas contábeis adotadas no país devem seguir o International Financial Reporting Standards (IFRS), padrão internacional de contabilidade, obrigatoriamente a partir de 2010”, conclui Hadlich.